RESENHA CRÍTICA – A ARTE DE
AMAR (ERICH FROMM)
1.
Identificação da obra
FROMM, Erich, A arte de amar. São Paulo: Martins
Fontes, 2000.
2. Credenciais do autor: Nascido
em 23 de março de 1900, Frankfurt, Alemanha. Psicanalista, filósofo e
sociólogo. Foi diretor do Instituto de pesquisas sociais de Frankfurt e fez
parte do grupo de psicanalistas marxistas junto de Reich e Fenichel. Lecionou
na Columbia University de Nova Iorque (1934) e na Universidad Nacional Autónoma
do México – UNAM (1950). Filiado ao movimento pacifista americano em 1957.
Morreu em 18 de março de 1980, Muralto, Suíça.
3. Resumo da obra
Neste livro, Fromm
procura expor que o amor é um sentimento muito difícil de ser cultivado de modo
pleno e é completamente dependente do nível de maturidade que cada ser alcança
em sua existência. Desta maneira, quaisquer tentativas de cultivo desse
sentimento estão fadas ao fracasso caso o indivíduo não procure, com máxima
atividade, desenvolver sua personalidade total direcionada a uma orientação
genuinamente produtiva. O ápice do sentimento de amor individual só pode ser
atingido através da capacidade de amar ao próximo. Uma atitude que deve ser
balizada pela humildade, coragem, fé e disciplina.
Em uma sociedade que considera o “ser amável”
um misto de popularidade com atração sexual, onde perdura o conceito de um
“amor romântico” egoísta e se atribuem as relações de amor os mesmo padrões
utilitários da lógica de mercado, é impossível que se desenvolva
verdadeiramente um sentimento de amor por inteiro. Daí a necessária urgência de se superar essa
falência amorosa através do domínio da “arte de amar” que como qualquer arte
exige para seu aprendizado a compreensão de seus aspectos teóricos e práticos
além de uma extrema preocupação do “artista” com o desenvolvimento de sua arte.
O amor deve ser visto
como uma resposta amadurecida ao problema da existência. Antes de tudo,
consiste em dar e não em receber. Exige preocupação ativa pela vida e
crescimento daquilo que amamos e envolve de maneira interdependente aspectos
como: cuidado, responsabilidade, respeito com liberdade e conhecimento. Implica
por sua vez o desprendimento dos sonhos narcisistas de onisciência e
onipotência, sem limites, da cultura pós-moderna.
É essencial reconhecer
na existência humana o fato de este ser o único ser que se rebelou contra a
adaptação instintiva. Ser que se desvia da natureza, embora ainda seja parte
integrante dela, através da razão e que uma vez expulso do paraíso já não pode
mais retornar ao seu estado original de união com o natural. Deve seguir em
frente em busca de uma nova harmonia que substitua a harmonia pré-humana
anteriormente perdida. Agora, como raiz do fato de ter-se feito consciente de
si mesmo, lhe anima uma necessidade de transcendência que lhe justifique sua
inclusão no cosmo devido a sua insatisfação com o fato de cumprir o papel
passivo de Ser criado.
Inúmeras são as formas
de satisfazer essa necessidade de transcendência. A mais natural é o próprio
cuidado e amor que uma mãe tem por sua criatura e que lhe dá significação para
a vida. Pela própria impossibilidade de satisfazer suas necessidades dessa
forma, o homem procura então transcender por meio do trabalho, da criação das
coisas e ideias.
No entanto, não existe
possibilidade de transcendência plena desprendida de uma prática da arte de
amar. Essa arte, por sua vez, dá-se de diferentes formas dependendo do objeto
que é amado: amor materno; amor fraterno; amor erótico; amor próprio; amor a
deus. Distante da prática dessas formas de amor o que resta é o desmoronamento
das tradições culturais em meio a numerosas formas de pseudo-amor que na
realidade colocam-se só como meios de desintegração do amor.
A prática da arte de
amar, que ainda hoje se configura como fenômeno marginal na sociedade
ocidental, exige por fim a prática da fé racional: a fé na capacidade
revolucionária do homem de livrar-se do narcisismo que o corrói; a fé nas
potencialidades do homem de criar e edificar uma ordem social governada pelos
princípios da igualdade, da justiça e do amor.
4. Crítica do resenhista:
Erich Fromm,
visivelmente influenciado pelos textos de Sigmund Freud e Karl Marx, expõe de
forma lúcida sua crítica ao modelo de sociedade contemporânea que vem se
formando no século XX. Apontando que este caminho, norteado pela lógica de
mercado e construído com base em uma visão racionalista e cientificista da
realidade só resolve problemas técnicos gerando soluções insuficientes e
insustentáveis, desviando-se por sua vez dos reais problemas existenciais da
humanidade.
Embora, naturalmente somos seres egoístas
impulsionados ainda por instintos primitivos e cegos de replicação genética.
Somos também a única espécie capaz de reconhecer esse fato e de criar as
condições necessárias para transcendência dessa realidade. Somos seres dotados
do poder de recriar novas formas de “ser humano”, de se adaptar e sobrepor-se a
miséria e a opressão atual.
Se a arte de amar, em um primeiro momento, se
apresenta como um paradigma bastante audacioso e quase impossível de cumprir-se,
o amor em si mesmo apresenta-se também como a única possibilidade, como uma
utopia capaz de impor os limites necessários ao narcisismo onisciente e
onipotente da civilização contemporânea.
Gabriel Horn Iwaya