domingo, 4 de agosto de 2013

RESENHA CRÍTICA – A ARTE DE AMAR (ERICH FROMM)
1. Identificação da obra
FROMM, Erich, A arte de amar. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

2. Credenciais do autor: Nascido em 23 de março de 1900, Frankfurt, Alemanha. Psicanalista, filósofo e sociólogo. Foi diretor do Instituto de pesquisas sociais de Frankfurt e fez parte do grupo de psicanalistas marxistas junto de Reich e Fenichel. Lecionou na Columbia University de Nova Iorque (1934) e na Universidad Nacional Autónoma do México – UNAM (1950). Filiado ao movimento pacifista americano em 1957. Morreu em 18 de março de 1980, Muralto, Suíça.

3. Resumo da obra
            Neste livro, Fromm procura expor que o amor é um sentimento muito difícil de ser cultivado de modo pleno e é completamente dependente do nível de maturidade que cada ser alcança em sua existência. Desta maneira, quaisquer tentativas de cultivo desse sentimento estão fadas ao fracasso caso o indivíduo não procure, com máxima atividade, desenvolver sua personalidade total direcionada a uma orientação genuinamente produtiva. O ápice do sentimento de amor individual só pode ser atingido através da capacidade de amar ao próximo. Uma atitude que deve ser balizada pela humildade, coragem, fé e disciplina.
             Em uma sociedade que considera o “ser amável” um misto de popularidade com atração sexual, onde perdura o conceito de um “amor romântico” egoísta e se atribuem as relações de amor os mesmo padrões utilitários da lógica de mercado, é impossível que se desenvolva verdadeiramente um sentimento de amor por inteiro.  Daí a necessária urgência de se superar essa falência amorosa através do domínio da “arte de amar” que como qualquer arte exige para seu aprendizado a compreensão de seus aspectos teóricos e práticos além de uma extrema preocupação do “artista” com o desenvolvimento de sua arte.
            O amor deve ser visto como uma resposta amadurecida ao problema da existência. Antes de tudo, consiste em dar e não em receber. Exige preocupação ativa pela vida e crescimento daquilo que amamos e envolve de maneira interdependente aspectos como: cuidado, responsabilidade, respeito com liberdade e conhecimento. Implica por sua vez o desprendimento dos sonhos narcisistas de onisciência e onipotência, sem limites, da cultura pós-moderna.
            É essencial reconhecer na existência humana o fato de este ser o único ser que se rebelou contra a adaptação instintiva. Ser que se desvia da natureza, embora ainda seja parte integrante dela, através da razão e que uma vez expulso do paraíso já não pode mais retornar ao seu estado original de união com o natural. Deve seguir em frente em busca de uma nova harmonia que substitua a harmonia pré-humana anteriormente perdida. Agora, como raiz do fato de ter-se feito consciente de si mesmo, lhe anima uma necessidade de transcendência que lhe justifique sua inclusão no cosmo devido a sua insatisfação com o fato de cumprir o papel passivo de Ser criado.
            Inúmeras são as formas de satisfazer essa necessidade de transcendência. A mais natural é o próprio cuidado e amor que uma mãe tem por sua criatura e que lhe dá significação para a vida. Pela própria impossibilidade de satisfazer suas necessidades dessa forma, o homem procura então transcender por meio do trabalho, da criação das coisas e ideias.
            No entanto, não existe possibilidade de transcendência plena desprendida de uma prática da arte de amar. Essa arte, por sua vez, dá-se de diferentes formas dependendo do objeto que é amado: amor materno; amor fraterno; amor erótico; amor próprio; amor a deus. Distante da prática dessas formas de amor o que resta é o desmoronamento das tradições culturais em meio a numerosas formas de pseudo-amor que na realidade colocam-se só como meios de desintegração do amor.
            A prática da arte de amar, que ainda hoje se configura como fenômeno marginal na sociedade ocidental, exige por fim a prática da fé racional: a fé na capacidade revolucionária do homem de livrar-se do narcisismo que o corrói; a fé nas potencialidades do homem de criar e edificar uma ordem social governada pelos princípios da igualdade, da justiça e do amor.

4. Crítica do resenhista:
            Erich Fromm, visivelmente influenciado pelos textos de Sigmund Freud e Karl Marx, expõe de forma lúcida sua crítica ao modelo de sociedade contemporânea que vem se formando no século XX. Apontando que este caminho, norteado pela lógica de mercado e construído com base em uma visão racionalista e cientificista da realidade só resolve problemas técnicos gerando soluções insuficientes e insustentáveis, desviando-se por sua vez dos reais problemas existenciais da humanidade.
Embora, naturalmente somos seres egoístas impulsionados ainda por instintos primitivos e cegos de replicação genética. Somos também a única espécie capaz de reconhecer esse fato e de criar as condições necessárias para transcendência dessa realidade. Somos seres dotados do poder de recriar novas formas de “ser humano”, de se adaptar e sobrepor-se a miséria e a opressão atual.

Se a arte de amar, em um primeiro momento, se apresenta como um paradigma bastante audacioso e quase impossível de cumprir-se, o amor em si mesmo apresenta-se também como a única possibilidade, como uma utopia capaz de impor os limites necessários ao narcisismo onisciente e onipotente da civilização contemporânea.
Gabriel Horn Iwaya